segunda-feira, 15 de outubro de 2012



A LINHA

Linha é um traço contínuo sem espessura determinada podendo ser reta, curva, quebrada ou mesmo mista.
Também pode ser uma equipa de jogadores, um fio metálico, de algodão, de seda, de estopa, um barbante, um atilho, um baraço, um cordel, um cordão, uma guita.
Podemos fazer parte da linha, fazer trinta por uma linha, estar em linha, perder a linha, manter a linha, atravessar a linha, enfiar a linha, dar um nó na linha, coser com linha, atar com linha, marchar em linha, ter em linha de conta, saber por linhas de comunicação, por linhas travessas, escrever na linha ou entre linhas e até há quem escreva direito por linhas tortas e quem goste de estar na linha da frente.
Há a linha de água dos navios, a linha de montagem numa fábrica, a linha por onde circulam os comboios e a linha do horizonte.
Numa batalha estamos em linha de invasão ou de retirada. Projeta-se a linha de combate metralha-se ou bombardeia-se em linha.
Há a linha de parentesco, de respeito, da vida e cada um sabe das linhas com que se cose.

João do Carmo


ÀS VOLTAS COM A LINHA
                                                                                                 
Faz a rede bem feitinha
Pró pescador exigente
Se acaso te faltar linha
Faltará peixe prá gente

Vou à pesca com anzol
Na ponta deste barbante
Vou pró cais ó pôr-do-sol
E voltarei ó levante

Dá-lhe guita! Dá-lhe guita!
Tua estrela vai subir
É a estrela mais bonita
Sustem-na pra não cair

Vou lançar o meu pião
Com cordão de lançador
Girará na minha mão
E darto-hei, meu amor

O baraço que fizeste
Faz girar o meu pião
E o beijo que me deste
Alegrou meu coração

Linha d’água do batel
Por mim traçada a rigor
Usei um simples cordel
Inspirado no amor

João do Carmo

ABRIL, sempre!

Para quem viveu antes de Abril
E não esqueceu a ditadura
Lembra esse tempo como vil
E o bufo espreitando, servil
Denunciando quem lutava com bravura

Um tempo que não voltará nunca mais
Assim os bravos sejam respeitados
Nem mandantes nem outros que tais
Povo livre de escolheres para onde vais
E sempre ao lado dos deserdados

Repressão para sempre banida
Querer inquebrantável decidido
Alegria pelo alvor duma nova vida
Medo, palavra do dicionário banida
E vontade de nunca mais ser vencido

João do Carmo

domingo, 6 de maio de 2012


Há 70 Anos
    
Estamos em meados do ano de 1942.
A Segunda Grande Guerra Mundial que começou em Setembro de 1939 está no auge. Em aliança, alemães, italianos e japoneses, formam o chamado “Eixo” que representa o Nazi-fascismo. As tropas do exército alemão estão agora em força empenhadas na ocupação da União Soviética e já ocuparam parte dos países da Europa. A Espanha, com a sua liberdade esmagada em 1939, está arrasada por uma revolução brutal que deu lugar à ditadura de Franco.
Também por cá temos idêntico regime chefiado por Salazar. Está organizada a Polícia Política com seus bufos e lambe botas. A Legião Portuguesa e a Mocidade Portuguesa, formadas obrigatoriamente por funcionários públicos e estudantes, são organizações para militares. A par disto, também alguns patrões menos escrupulosos e os grandes monopolistas fazem questão em que os seus empregados façam parte de alguma destas organizações. Vivemos num verdadeiro clima de ditadura que teima em perseguir quem se lhe oponha. As pessoas não se abrem em opiniões que não estejam em sintonia com a situação vigente, sabendo que ali ao seu lado pode estar um bufo que o irá denunciar à Polícia de Vigilância e Defesa do Estado “PVDE”. Isto acontece tanto no seu local de trabalho como no café ou na taberna que habitualmente frequenta, podendo o bufo ser tanto o empregado que o serve, como o engraxador que está a limpar-lhe os sapatos, o cauteleiro que vem vender-lhe uma cautela para a lotaria, ou alguém que ali está na mesa ao lado ou, até mesmo, um vizinho que se diz nosso amigo.
Impera o analfabetismo. Vive-se numa grande pobreza e é normal verem-se pessoas descalças nas ruas, muitas pedindo esmola, assim como cegos tocando violino, bandolim, saxofone ou outro instrumento, com a caixa das esmolas pendurada ao pescoço por uma correia sendo por vezes acompanhados por alguém que canta uma cantiga que relata uma desgraça acontecida recentemente e depois vende, a quem por ali passa, os versos impressos num folheto. Também há os pedintes já duma certa idade e doentes, que aparecem a um dia fixo da semana pedindo de porta em porta e que se tornam às vezes um pouco íntimos de quem os recebe e que deixam alguma saudade no dia em que, para sempre, deixam de aparecer.
Muitas empresas fabris não têm refeitórios para todos os operários e à hora do almoço vêem-se estes a comer na rua sentados nos passeios ou num sítio mais recatado, muitas vezes acompanhados das suas companheiras ou de outro familiar, talvez uma filha, que lhes vai levar o almoço. Também há quem vá à taberna comer o almoço que traz de casa a troco da compra do vinho muitas vezes “baptizado”, comprado ao taberneiro.
O fato de ganga para o trabalho é quase sempre usado todo o dia, pois o fatinho melhor está guardado para o domingo.
Qualquer patrão pode despedir um empregado quando entender sem que ao menos tenha que lhe dar um aviso prévio.
Os melhores empregos são conseguidos nos Bancos ou Companhias de Seguros. Também os empregos públicos são preferidos por serem mais estáveis e pela reforma ao fim duma vida de trabalho, mas com o inconveniente de ter que se fazer parte da Legião Portuguesa, o que por vezes é motivo de recusa por parte dos trabalhadores mais conscientes.
Quem adoecer tem que chamar um médico a casa ou vai ao seu consultório, a quem tem que pagar a consulta e é tratado sempre por tu seja qual for a sua idade. Em caso de necessidade de internamento hospitalar, é necessário pagar uma caução de quinze dias depois de ser calculada a importância, após interrogatório onde se quer saber o ordenado do chefe de família, o agregado familiar, a renda de casa, etc.
Vamos comprar à mercearia um quilo de batatas ou uma posta de bacalhau demolhado ou uma quarta de manteiga ou duzentos gramas de açúcar, cem gramas de marmelada ou de banha. Ao leiteiro compramos um litro de leite que vem vender-nos à porta, às vezes acrescentado com urina que se diz não ser detectável nas análises da fiscalização que também é muito deficiente. Na padaria compramos um quilo de pão de segunda e voltamos para casa comendo o contrapeso pelo caminho. No talho compramos um naco de torresmos, duzentos gramas de carne para cozer que muitas vezes é pesada com a ajuda do dedo do talhante, um pouco de carne entremeada, um chouriço de carne, uma morcela, um pouco de toucinho e uma farinheira. No lugar da hortaliça a couve portuguesa, uma cabeça de nabos, dois tostões de cenouras e um raminho de salsa que a dona do lugar nos oferece e com aquilo que comprámos no talho ficam os ingredientes para o cozido à portuguesa que aqueles, um pouco mais afortunados, fazem para o almoço de domingo. Tudo é comprado em pequenas quantidades e quem ganha é o merceeiro ou o talhante porque tudo é embrulhado em papel, muito mais barato que o artigo que nele foi embrulhado e posto na balança, mas como a despesa é apontada no rol para ser paga quando for possível, as pessoas, reféns do favor feito, aceitam ser defraudadas ou nem sequer se apercebem disso. Na praça do peixe compramos um par de chicharros ou na lota estamos à espera que o pescador nos dê umas sardinhas que pomos dentro duma alcofa ou mesmo dentro da boina que tiramos da cabeça e ficamos a aguardar nova oferta até que julgamos suficiente para o almoço que será preparado em casa. Ainda temos as senhas de racionamento para os géneros de primeira necessidade como pão, azeite, manteiga, etc. Cozinhamos a petróleo ou a carvão que também são racionados e, do cisco do carvão, que aproveitamos para que nada se desperdice, misturado com greda que vamos apanhar ao campo e com a ajuda de água, fazemos a massa que dará aquilo a que chamamos bolas feitas com auxílio duma argola de ferro diâmetro + - 80 mm x 20mm, que é a forma que se enche e calca batendo com uma palmatória geralmente de ferro para que fiquem bem compactadas e servem, depois de secas geralmente ao sol, para pôr no fogareiro à volta do carvão e assim obtemos melhor calor para a confecção dos alimentos.
Também cozinhamos com fogareiros a serradura amassada com água e metida dentro duma lata vazia de cinco litros, à qual fizemos um furo lateral junto à base aí a dois dedos do fundo, com diâmetro mais ou menos trinta milímetros e enfiamos por aí um rolo de madeira que se irá encontrar com outro que é posto dentro da lata na vertical e ao centro da mesma e ambos se retiram quando a serradura, que tivemos o cuidado de calcar muito bem, está seca. Agora, temos o fogareiro pronto a ser aceso pelo furo transversal, que irá queimando lentamente a serradura de baixo para cima e irá servir durante grande parte do dia para cozinhar os alimentos e entretanto preparamos outro fogareiro para estar seco no dia seguinte.    
Muitas das nossas casas são iluminadas com candeeiros a petróleo.
Como não temos casa de banho equipada com banheira para o banho semanal, temos que nos lavar por partes: primeiro da cintura para cima, depois o resto do tronco e por fim os pés e pernas, muitas vezes com água fria, ou então, numa banheira geralmente redonda feita em chapa de zinco que foi colocada numa divisão da casa para aquela ocasião aquecendo a água dentro de panelas grandes. O banho é tomado à tardinha de sábado para os filhos da casa, que depois são metidos na cama e a mãe carinhosa lhes irá levar o jantar quando for hora.
Nas Associações Recreativas, formadas com o advento da República, se sente a repressão na organização de Bibliotecas, Grupos Cénicos e outras iniciativas culturais. Todas as publicações, tais como jornais, revistas ou livros e também todas as formas de teatro, são censuradas: logo se compreende as dificuldades que essas Associações encontram para levar por diante os seus objectivos que são a difusão da cultura. Com frequência acontece que as peças de teatro prontas a serem representadas e que previamente foram enviadas obrigatoriamente à Comissão de Censura para aprovação, serem devolvidas com palavras, frases ou parágrafos eliminados com o lápis azul da Censura ou pura e simplesmente com o carimbo vermelho de “Proibido pela Comissão de Censura”. As bibliotecas recebem com alguma frequência a visita dos “censores” que proíbem que tal ou tal livro esteja em exibição, tendo que se reservar uma estante ou parte dela onde esses livros estão encerrados de modo inviolável com o indicativo da “Comissão de Censura”, ou são levados e deixamos de saber o seu paradeiro.
Mas há também quem não aceite tal estado de coisas. O movimento grevista surge nas grandes empresas tais como Companhia Carris de Ferro de Lisboa ou Companhia União Fabril. Também as varinas em Lisboa organizam uma grande manifestação de protesto contra o regime. Nos campos também se sente a revolta social com grandes movimentações reivindicando o fim do trabalho de sol a sol e por melhores salários. A repressão é violenta. Muitos trabalhadores são presos e aqueles considerados lideres, proibidos de voltar aos seus empregos ou são deportados para o Campo de Concentração do Tarrafal em Cabo Verde onde já estão outros antifascistas na sua maioria comunistas e os revoltosos marinheiros dos navios de guerra Dão, Bartolomeu Dias e Afonso de Albuquerque num total de 60, de entre os quais o Joaquim Casquinha filho de Paço de Arcos.

                                                                      João do Carmo

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

EQUIPA DE HÓQUEI EM PATINS
Trata-se da equipa júnior do então PAÇO DE ARCOS HÓQUEI CLUBE ( actual Clube Desportivo de Paço de Arcos) no ano de 1941.
Em cima: Rui Lince, Horácio Matias e Mário Dias
Em baixo: António do Carmo e João do Carmo
Esta equipa foi campeã no 1º Campeonato de Júniores de Lisboa em 1942
- Por curiosidade, acrescento que eu fui o jogador mais novo inscrito na Federação Portuguesa de Patinagem
com 13 anos de idade.